domingo, 20 de abril de 2014

Malala lança livro e afirma: "Quero me tornar primeira-ministra do Paquistão"


Malala lança livro e afirma: "Quero me tornar primeira-ministra do Paquistão"

Nova York, 10 out (EFE).- Um ano após sobreviver de forma milagrosa a um ataque terrorista, a jovem Malala tem hoje, mais claro do que nunca, que deve continuar a defender a educação feminina, e está disposta a estudar, entrar para a política e "chegar, algum dia, a ser primeira-ministra do Paquistão".
"A melhor forma de lutar contra o terrorismo e pela educação é por meio da política. Por isso fiz essa escolha. Um médico só pode ajudar uma comunidade, mas um político pode ajudar todo um país", disse nesta quinta-feira a jovem ativista paquistanesa em entrevista à Agência Efe na ocasião do lançamento de seu livro "Eu sou Malala".
Há anos, Malala sonhava em ser médica porque na sociedade pashtun "é difícil para uma menina imaginar" o que pode chegar a ser.
Depois que começou a ver o mundo, pouco a pouco, e a conhecer mulheres como Benazir Bhutto, e ícones como Martin Luther King e Nelson Mandela, ela então pensou: "Malala, você pode ser quem quiser".
Há um ano, no dia 9 de outubro, dois talibãs pararam a caminhonete na qual ela voltava do colégio no Vale do Swat. "Esse dia eu estava pensando no trabalho que tinha que entregar na escola, sem saber que essa viagem de volta para casa terminaria em um hospital de Birmingham (Inglaterra)", lembrou a jovem.
As lembranças do momento do ataque são vagas, a maioria dos detalhes que sabe foram contados a ela depois. Um dos terroristas perguntou: "Quem é Malala?". Então, ela agarrou "com força" a mão de Moniba, sua melhor amiga, mas não teve tempo de dizer nada porque atiraram contra ela à queima-roupa.
"Quis responder, mas não me deixaram. Agora sim posso. Sou Malala e quero contar minha história neste livro", explicou a jovem ativista, que tenta abrir mão de seu protagonismo ao garantir que, na realidade, o que retrata é a vida de todas as pessoas que sofreram com o terrorismo, a ignorância, o analfabetismo, "e é por elas que quero levantar minha voz".
Transformada em ícone global da educação feminina, e candidata ao Nobel da Paz que será anunciado amanhã, Malala não hesita por um só instante quando é questionada sobre os talibãs.
"São apenas terroristas que querem impor suas leis através das armas e em nome do Islã. Mas o verdadeiro Islã é uma religião de respeito, de tolerância, de paz", garantiu.
Malala reconheceu que nesta nova etapa, repleta de viagens, entrevistas e atos públicos, tem dificuldades para continuar os estudos, mas seu sonho continua intacto: um mundo "muito simples" em que todas as crianças frequentam escolas, onde aprendem, têm livros e lápis, e vivem uma vida feliz e em paz.
"Hoje é um sonho, mas conseguiremos fazer com que amanhã isso seja uma realidade", garantiu a jovem, que agradeceu pelas demonstrações de apoio e amor que recebe. "Agora sinto que é minha responsabilidade seguir trabalhando pela educação e defender os direitos daqueles que sofrem com o terrorismo e que não têm voz", comentou.
Em algumas ocasiões, ela mesma parece esquecer que acaba de completar 16 anos. "Muitas vezes me pergunto se devo fazer os deveres ou me concentrar no livro ou no trabalho da Fundação Malala. Todas essas coisas são importantes, mas então penso: 'Malala, não tem problema se você perder dez minutos assistindo televisão ou jogando críquete'", contou.
Graças "ao Skype e ao celular" Moniba conta para a amiga o que acontece na escola e em seu dia a dia. Malala conversa também com Malka-E-Nur, outra menina com quem costumava competir por notas no colégio. "Um dia ela me disse que não gostava mais das provas porque não tem com quem competir, e que sente minha falta. Esquecemos a rivalidade e agora também somos amigas".
Sobre sua vida em casa, longe das câmeras e à margem dos discursos, fala com ternura de seus dois irmãos menores, e de como passam "o dia todo brigando e jogando no iPad", como outras crianças de sua idade.
O pai da jovem ativista, Ziauddin, diz que agora ela deve se concentrar em sua recuperação, mas Malala diz que o que quer é "continuar aprendendo, estudar muito, e frequentar uma boa universidade para poder voltar algum dia ao Paquistão. É meu país e ninguém esquece a terra onde nasceu. Espero poder voltar o mais rápido possível", concluiu. EFE

Direitos das mulheres (de acordo com a ONU)




De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), são direitos das mulheres:
  • Direito à vida.
  • Direito à liberdade e à segurança pessoal.
  • Direito à igualdade e a estar livre de todas as formas de discriminação.
  • Direito à liberdade de pensamento.
  • Direito à informação e à educação.
  • Direito à privacidade.
  • Direito à saúde e à proteção desta.
  • Direito a construir relacionamento conjugal e a planejar sua família.
  • Direito a decidir ter ou não ter filhos e quando tê-los.
  • Direito aos benefícios do progresso científico.
  • Direito à liberdade de reunião e participação política
  • Direito a não ser submetida a torturas e maltrato.

DIREITOS DA MULHER: ALGUNS ASPECTOS POLÊMICOS QUANTO À AFIRMAÇÃO DA IGUALDADE E À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS


DIREITOS DA MULHER: ALGUNS ASPECTOS POLÊMICOS QUANTO À AFIRMAÇÃO DA IGUALDADE E À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS

Fernando de Brito Alves
Doutor em Direito Constitucional pelo Instituto Toledo de Ensino – Bauru – SP. Pós-doutorado (em andamento) em Democracia e Direitos Humanos pelo Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX da Universidade de Coimbra (CEIS20) e Ius Gentium Conimbrigae (Centro de Direitos Humanos) da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Professor Adjunto da Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP).
Mayara Alice Souza Pegorer
Professora universitária e Mestranda em Ciência Jurídica pelo Programa de Mestrado da Universidade Estadual do Norte do Paraná – UENP. Estudante-pesquisadora bolsista da CAPES, participante de grupos de pesquisa da referida instituição, seguindo estudos nas áreas de Jurisdição e Direitos Fundamentais e efetividade dos Direitos Fundamentais no Brasil, com ênfase nos Direitos Sexuais e Reprodutivos da Mulher. E-mail: mayarapegorer@hotmail.com.

RESUMO
Pode-se conferir aos movimentos feministas o reconhecimento dos direitos sexuais e reprodutivos como direitos humanos e fundamentais e sua titularidade pela mulher, fruto de um processo de busca da afirmação da igualdade material de gênero, o qual encontrou e ainda encontra na sociedade pós-moderna inúmeros aspectos polêmicos. Soma-se a tanto o fato de que a cada dia relevam-se novos desafios de proteção impostos pelo desenvolvimento social e tecnológico quanto ao exercício da sexualidade e reprodução, que muitas vezes acabam não encontrando solução no ordenamento jurídico. Assim, faz-se uma breve análise histórica da construção do direito da mulher e de questões controversas surgidas na afirmação de sua igualdade material, inclusive em decisões dos Tribunais brasileiros. A seguir, aborda-se a conquista dos direitos sexuais e reprodutivos, traçando sua definição e listando alguns aspectos polêmicos que ilustram os novos horizontes e paradoxos ao exercício de tais direitos e seu reconhecimento na ordem brasileira, tais como o aborto, a inseminação artificial post mortem e a maternidade de substituição, que envolvem questões éticas, responsabilidade estatal e consequências patrimoniais.

PALAVRAS-CHAVE: Direitos da mulher. Direitos sexuais e reprodutivos. Aborto. Inseminação artificial post mortem. Maternidade de substituição.
INTRODUÇÃO
Ainda que a conquista de direitos pela mulher tenha sito fruto de muitas lutas e quebra de paradigmas, almejando alcançar a igualdade material de gênero, é notório que novos desafios surgem a cada dia, exigindo uma proteção cada vez mais abrangente e efetiva.
É o caso dos direitos sexuais e reprodutivos, cuja titularidade feminina ainda representa um “tabu”, e cuja compreensão só foi possível pela separação de exercícios da sexualidade e reprodução, ante os avanços biotecnológicos quanto aos mecanismos de contracepção e reprodução assistida.
O desenvolvimento social e biológico, por sua vez, resulta em inúmeros aspectos polêmicos, envolvendo inclusive questões de ordem ética na afirmação desses direitos, como o aborto, a inseminação artificial post mortem e a maternidade de substituição.
O presente texto representa um compêndio de trabalhos já publicados pelos autores e estudos desenvolvidos na área abordando as temáticas assinaladas e que serviram de base à participação no III JORESP – Jornada Regional de Educação Sexual do Paraná e I CISEX – Colóquio Internacional de Sexualidades da UENP. 
1 A CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DAS MULHERES E ASPECTOS POLÊMICOS À AFIRMAÇÃO DA IGUALDADE MATERIAL
A principal teórica do direito feminista é Tove Stang Dahl, jurista norueguesa, professora da Universidade de Oslo e pioneira no estudo, investigação e ensino do Direito das Mulheres. Nas primeiras páginas de sua obra editada em português (1993, p. 04-05), ela apresenta uma justificativa do nascimento do direito das mulheres como disciplina jurídica em um contexto de eliminação das discriminações em função do sexo, pelo menos na legislação norueguesa.
De acordo com a autora, leis sobre igualdade de tratamento não produzem por si só tratamentos igualitários do ponto de vista fático. Analisando-se as conseqüências do direito, na sua tormentosa relação com o mundo dos fatos é possível encontrar situações em que a discriminação positiva, ou inclusiva, quer pelo reforço da igualdade, quer pela acentuação das diferenças se fazem necessárias.
A perspectiva feminista do direito faz-se “por meio de um corte transversal sistemático, através das normas legais existentes, visando aperceber-se de conexões significativas para todos os indivíduos, mas em especial e diretamente para as mulheres” (Dahl, 1993, p. 25). Além do que a perspectiva pluralista do direito enfatiza o pluralismo das fontes, em oposição ao positivismo legalista. O Direito das Mulheres teria nessa perspectiva “poucos indicadores formais na lei” (idem, p. 29).
Ainda de acordo com Dahl, “a igualdade técnica pode ter a discriminação de fato como resultado, tal como a discriminação pode promover a igualdade de fato” (1993, p. 58) isso significa que é preciso para a finalidade precípua da inclusão observar não o direito formal, mas como acontece o direito concretamente.
Na cultura ocidental de um modo geral a mulher sempre foi marginalizada, quer por conta da tradição judaico-cristã que é machista, quer pela divisão sexual do trabalho e a construção de um ideal de mulher restrita à esfera doméstica, limitada ao cuidado do lar etc.
Apesar do caráter machista do iluminismo e da revolução francesa, é lá que muitas mulheres encontram fundamentação teórica para o feminismo, principalmente com base nas convicções de que existem direitos inalienáveis, que fazem parte da natureza humana e no princípio da igualdade formal.[1]
Quando das discussões preliminares à proclamação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, inclusive, chegou a haver discussão da inclusão na declaração de direitos da mulher e da cidadã, o que foi rejeitado sob a perspectiva de que o masculino se refere ao gênero e que por isso pressuporia o feminino. A tônica machista da declaração serviu depois para privar a mulher dos supostos direitos que havia adquirido.
Apesar disso,
Foi inspirada pelo Iluminismo e pela Revolução Francesa que a professora e escritora radical inglesa Mary Wollstonecraft publicou AVindication of the rights of woman em 1972. Defendia o direito natural dos indivíduos à autodeterminação, em oposição às leis arbitrárias e hereditárias, e acreditava na capacidade dos seres humanos (incluindo as mulheres) de melhorar a sociedade criando novas relações entre as pessoas com base no princípio da igualdade. Para ela, mulheres e homens, têm o mesmo potencial para desenvolver talentos e habilidades e, portanto, deveriam receber as mesmas oportunidades em termos de educação e participação social. (PINSKY, PEDRO in PINSKY, 2003, p. 266) 
Os filósofos, escritores, burgueses, jornalistas e revolucionários de todo tipo, no combate ao Antigo Regime, ridicularizavam o papel desempenhado pelas mulheres na política, nas Cortes, e fora delas (Cf. PINSKY, PEDRO in PINSKY, 2003, p. 267), o que favoreceu a construção do lugar ideal da mulher na sociedade. A Rousseau foi atribuída a frase“uma mulher virtuosa é pouco menos que um anjo”, pouco depois tornada lugar comum, denotava a polarização de papéis de homens e mulheres, e justificava uma natural superioridade e autoridade masculinas.
De acordo com Carla Bussanezi Pinsky e Joana Maria Pedro (2003, p. 269) a maior parte dos homens que apoiavam a Revolução Francesa, independentemente de suas convicções políticas ou filosóficas, não achavam que a liberdade, a fraternidade e a igualdade estendiam-se às mulheres, e que, apesar de sua importância considerável para a consolidação da Revolução, deveriam voltar para a vida doméstica, onde desfrutariam dos benefícios da Revolução sem subverter a ordem natural das coisas.
Como o papel das mulheres fora relegado ao lar, suas primeiras lutas estavam relacionadas com os seus interesses de donas de casas, reivindicando o controle dos preços e que o Estado tivesse postura mais protetiva com os menos favorecidos. Suas reivindicações não foram atendidas.
As transformações econômicas do século XIX criaram duas situações absolutamente antagônicas. Nasce a possibilidade pelas mulheres de classe média, esposas de burgueses ou de altos funcionários das indústrias, de se livrarem do serviço doméstico, que passou a ser desempenhado por uma empregada doméstica.  O seu par antagônico foi a situação das mulheres proletárias que eram submetidas a jornadas duplas de trabalho em situações absolutamente desfavoráveis, ficando vulneráveis nas fábricas a todo tipo de sevícias, sendo muitas vezes desrespeitadas em sua liberdade sexual, e remuneradas muito inferiormente aos homens.
As sociedades sexistas organizaram o ordenamento jurídico de modo a garantir o establishment. As mulheres sofreram uma espécie de capitis diminutio, sendo que passaram a ser consideradas à margem do direito, da mesma forma que os presos, e aqueles que têm desenvolvimento mental incompleto, quer sejam crianças, quer sejam deficientes mentais. Mesmo as leis mais democráticas mantiveram as mulheres nesse patamar. Nesse contexto a situação da mulher casada é pior que da mulher solteira que poderia administrar seus bens e é considerada capaz do ponto de vista jurídico.
Os códigos de lei nacionais negam às mulheres casadas (consideradas legalmente menores, sob a guarda do esposo a quem devem obediência) o controle de suas propriedades e ganhos e dão autoridade primária da família apenas ao marido. A superioridade do homem, que deve proteger a mulher, decorre da idéia da fragilidade do sexo feminino. O marido tem o dever de prover a mulher e seus filhos [...] e autoridade para dirigi-los; como chefe legal da casa, pode decidir sozinho sobre questões familiares relativas a educação, profissão, emprego, punições, alianças matrimoniais e a guarda dos filhos em casos de separação. Ao marido é permitido forçar a mulher a ter relações “sexuais normais” (sem sevícias graves) e a infidelidade feminina é punida mais severamente que a masculina. (PINSKY, PEDRO in PINSKY, 2003, p. 272)
Nos países latinos e de tradição católica o matrimônio era concebido como sacramento e portanto era indissolúvel, não apenas do ponto de vista religioso, mas inclusive sob os aspectos jurídicos. Ainda que na prática o casal pudesse viver separado, havia necessidade da manutenção dos deveres conjugais, como o de fidelidade por exemplo. Na Inglaterra, a partir de 1857, o divórcio é facilitado, antes disso só era possível se separar por meio de processo caro e que dependia de aprovação específica do Parlamento.
A sociedade como um todo preparou mecanismos de garantia da exclusão das mulheres, e o principal foi a educação. Houve de fato um considerável aumento da importância da educação formal para as mulheres ao longo do século XIX, todavia, apesar de as mulheres conseguirem a duras penas concluir o ensino secundário, dificilmente conseguiam ingressar no ensino superior. Nesse quesito, os Estados Unidos, principalmente nos estados mais a oeste, desde a metade do século XIX já admitia a presença de mulheres no ensino superior, enquanto a Europa só franqueou o acesso a Universidade, às mulheres, a partir de 1860.
A partir do final do século XIX começou a delinear-se um cenário aterrador. As atividades laborais destinadas às mulheres estavam vinculadas ao serviço doméstico – como dona-de-casa, governanta, ou dama-de-companhia –; ao magistério – que normalmente rendiam melhores salários –; ao serviço fabril ou à prostituição.
As mulheres eram submetidas a piores condições de emprego porque eram menos mobilizadas que os homens, e isso não era voluntário. Até os sindicatos masculinos colocavam-se contrários à sindicalização das mulheres e ao trabalho delas nas fábricas, que não era ambiente moralmente adequado para mulheres, além de elas serem menos qualificadas que os homens. 
As mulheres negras (abolida a escravidão) eram forçadas a empregar-se nas piores condições, reservadas às escalas inferiores da hierarquia social: agricultoras nas fazendas, operárias na infame indústria do tabaco, empregadas no serviço doméstico (que embora fosse uma alternativa melhor que as outras, evocava os maus tratos e a falta de liberdade do tempo da escravidão) (PINSKY & PEDRO in PINSKY, 2003, p. 282)
Com o advento da legislação trabalhista, a despeito do princípio da não interferência do Estado nas relações econômicas, os Estados começaram a ceder às pressões que vinham de todos os lados, desde a opinião pública aos sindicatos, e criar leis que melhorassem a condição de mulheres e crianças, que não eram consideradas cidadão plenos, e porquanto, vulneráveis. O trabalho no campo e o trabalho doméstico permaneceram sem qualquer regulamentação e, por isso, as mulheres ficaram submetidas a maior exploração do trabalho.
O movimento feminista nasce inspirado nas idéias do humanismo renascentista, principalmente relacionadas com a melhoria educacional, pois pretendiam que tal programa fosse aplicado às mulheres. No início do século XIX a luta já havia sido ampliada para a cidadania, os direitos políticos e os direitos sociais.

Bebendo nas fontes iluministas, inspiradas pelas idéias individualistas do protestantismo, ou apoiadas na valorização das especificidades femininas desenvolvidas com a crescente hegemonia da ideologia burguesa e a filantropia, as feministas no século XIX construíram suas concepções teóricas e ergueram suas bandeiras. Duas linhas distintas nortearam suas posições: a igualitarista (baseada no reconhecimento da igualdade entre os seres humanos, homens e mulheres) e adualista (que ressalta e valoriza a diferença e as contribuições culturais feministas); assim, em muitos assuntos, divergiam se queriam ou não que as mulheres recebessem um tratamento diferente do reservado aos homens. Em termos de enfoque, as feministas também distinguiram-se, privilegiando as lutas políticas e legais ou sociais e culturais e, por vezes, ligando-se a outros movimentos (de independência, liberais, revolucionários, abolicionistas, pacifistas, socialistas, anarquistas) – a experiência decepcionante com determinados aliados e revoluções fez crescer entre elas a consciência de gênero.(PINSKY, PEDRO in PINSKY, 2003, p. 287.)
Já foi dito que os direitos de diferença dos negros se fundamentam justamente na diferença, diferença historicamente construída, que precisa ser da mesma forma, historicamente desconstruída. Também foi dito que os direitos de diferença dos homossexuais, são propriamente direito de respeito à diferença, e se fundamentam na igualdade. As mulheres devem ter tratamento diverso dos negros e homossexuais quando se trata de direitos à diferença, porque existem circunstâncias em que injustiça é tratá-las de forma diferente da dos homens, e existem circunstâncias em que injustiça é, justamente, tratá-las de forma igual. 
O discurso da igualdade seduziu de um modo geral os movimentos pelos direitos iguais, que se desenvolveram e se tornaram populares, principalmente na Inglaterra a partir da década de 1830, o que trouxe alguns ganhos, como por exemplo o direito de frequentar cursos universitários e o de casadas poderem controlar seus ganhos (1878) e  administrar suas propriedades (1882). Na França e na Alemanha o feminismo crescia bastante durante as revoluções e logo depois recuava para dar lugar a uma onda de conservadorismo.
Nos Estados Unidos, o movimento pelos direitos iguais conseguiu organizar a Primeira Convenção pelos Direitos das Mulheres em Seneca Falls (Nova York) em 1848, as mulheres começaram a se organizar em associações e a promover encontros, sendo que a partir desse ano (muito antes do que ocorrera na Europa) conseguiram o direito de administrar seus bens e em 1869, o estado de Wyoming concedeu a elas o direito de voto.
Outra frente de batalha do Direito das Mulheres foi o socialismo feminista que acreditava na revolução socialista como meio de libertação da mulher.
A opinião pública acabou por associar ao socialismo a falsa crença de que eles defendiam a promiscuidade sexual e o “amor livre”, o que teria ficado implícito nas críticas que Marx dirige aos burgueses no Manifesto do Partido Comunista[2] e que Engels já havia feito na obra Familia, Propriedade Privada e Estado (1984). O que importa é que o capitalismo passou a ser identificado como a principal causa de opressão. As socialistas alemãs defendiam o direito de voto desde 1895, e foram apoiadas pela Internacional Socialista das Mulheres em 1910, que além disso defendia a isonomia salarial, o seguro maternidade, e proclamou o dia 8 de março como Dia Internacional da Mulher.
Houve quem defendesse a diferença[3]. Todavia o discurso da diferença sofreu sérios reveses principalmente depois do famoso “Caso Sears” (SCOTT, 2000, p. 203-222).
Interessante apontar que atualmente o discurso do Direito das Mulheres oscila entre a igualdade e a diferença, e apesar de em algumas circunstâncias parecer paradoxal, tal proceder é mais pertinente às nuances do caso concreto.
A conquista dos direitos para as mulheres se deu de forma lenta ao longo de todo o século XX. Dos direitos políticos aos sociais e, finalmente, os reprodutivos. Em 1913, por exemplo, as americanas (EUA) podiam ser eleitas e votar em nove estados, condição estendida a todas as mulheres, maiories de 21 anos, em 1919 pela 19a. Emenda à Constituição Americana. No norte da Europa isso ocorreu de forma prematura, antes mesmo dos Estados Unidos, esse movimento se intensificou, com mais ou menos restrições, pelo resto da Europa, principalmente depois da década de 1930. A Espanha republicana teve intensa modernização legislativa e cultural, vindo inclusive a reconhecer as uniões livres, o divórcio e o aborto, sendo que sua legislação sofre revés conservador com o advento ao governo do general Franco. Na Itália o antifeminismo é bastante explorado pelo fascismo o que vai retardar as conquistas de direitos para a mulher, até o final da Segunda Guerra. Na França os direitos políticos das mulheres datam de 1944, na Suíça de 1971 e Portugal de 1976.
No Brasil o direito de voto às mulheres já havia sido defendido por alguns deputados constituintes da Primeira Constituição da República[4]; no ano de 1905, três mulheres mineiras se alistaram e votaram, no entanto foi caso isolado. Apenas com a Revolução/Golpe de 1930, que algumas mulheres, entre elas Nathércia da Cunha Silveira e Elvira Komel, formaram uma comissão, que contou com o apoio do então ministro do Trabalho Lindolfo Collor, do Cardeal D. Sebastião Leme, e do governador de Minas Gerais, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada. Getúlio Vargas, através do Decreto nº. 21.076, de 1932, institui o Código Eleitoral Brasileiro, no qual o artigo 2o. disciplinava que era eleitor o cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo, alistado na forma do código. É de ressaltar que as disposições transitórias, no artigo 121, dispunham que os homens com mais de 60 anos e as mulheres em qualquer idade podiam isentar-se de qualquer obrigação ou serviço de natureza eleitoral. O voto feminino não era obrigatório, mas foi grande o número de mulheres alistadas, em 1933 uma mulher é eleita para a Assembléia Nacional Constituinte e em 1936 é eleita a primeira deputada federal, respectivamente Carlota Pereira de Quiróz e Bertha Lutz.
As profissões mais ocupadas por mulheres eram aquelas tradicionalmente consideradas extensões das atividades domésticas, como a de professora, pedagoga, enfermeira, etc. Algumas mulheres, já no início do século XX conseguiram se empregar na pesquisa e na medicina. Durante a recessão dos anos 30 o mercado de trabalho recuou e as mulheres foram acusadas de ocuparem os postos de trabalho dos homens, o que em alguma medida acabou por se reverter na segunda metade do século passado.
Com relação aos direitos sociais, as principais reivindicações se centravam na isonomia salarial e na possibilidade de escolha da profissão. Com relação à escolha profissional, não há dúvidas de que atualmente as mulheres têm condições, com raras exceções, de se autodeterminarem, não obstante, a questão salarial ainda continuar problemática. Mulheres tendem a ganhar, ainda hoje, salários menores que os dos homens nas mesmas funções.
Apresentado esse quadro, não é possível concluir com otimismo que a situação da mulher é a ideal. A maioria dos 1200 milhões de pobres do planeta é do sexo feminino. Mulheres trabalham mais do que 50% de todas as horas trabalhadas no mundo. Porém, só 30% do trabalho feminino aufere remuneração, enquanto esta percentagem para o trabalho masculino se situa nos 75%. Mulheres ainda ganham acentuadamente menos que homens e ascendem muito mais raramente a cargos elevados. Mulheres, em especial as jovens, estão mais freqüentemente expostas ao desemprego que homens. Uma em três mulheres é chefe de família, tendo que assumir sozinha o sustento e, ao mesmo tempo, a educação dos filhos. A maioria dos analfabetos é mulheres. Ainda hoje há menos meninas do que meninos no ensino básico. Em alguns países industrializados já há mais mulheres do que homens nas universidades. Em 2002, as mulheres representavam 50,4% dos estudantes que iniciaram um curso universitário na Alemanha, ao passo que na Tanzânia elas só correspondem a 22% dos estudantes[5].
No Brasil é fácil de perceber as novas estratégias de exclusão e a reinvenção das fronteiras sexuais, bem como a manutenção de antigas posições, mediante análise dos dados dos Indicadores de Desenvolvimento Sustentável.
A renda média de homens continua ainda bastante superior a das mulheres (Indicadores…, 2002, p. 25), apesar das mulheres estudarem mais que os homens. Durante toda a década de 90, os homens ganharam em média o dobro das mulheres. O estado que registrou menores índices de desigualdade em 1999 foi o Amapá[6].
Na União Européia houve várias iniciativas de promoção da igualdade de gênero, em relatório datado[7] de 11 de maio de 2006, referente ao ano anterior, apontaram-se as principais iniciativas da Comunidade Européia a respeito do tema, entre elas destacam-se: a adoção de um plano de ação de metas para promoção da igualdade de gênero, que definiu os problemas e estabeleceu metas até o ano de 2010; a modificação e simplificação da legislação européia atinente à questão trabalhista; a criação de organismos de proteção da igualdade; a proposta de criação de um Instituto Europeu de Igualdade de Gênero; a adoção de medidas sociais, que vão desde a promoção da tomada de decisões pela mulher até a luta pela equiparação salarial; a adoção de medidas de integração para mulheres migrantes, tendo em vista o combate da exploração sexual e doméstica; a adoção pela Comissão, o Conselho e o Parlamento Europeu de uma declaração conjunta sobre o desenvolvimento, que assinala a igualdade de gênero como um dos seus pilares; a integração dos gêneros nas novas estratégias da Europa com relação à África, entre outras. Além das atuações do Fundo das Nações Unidas para o Desenvolvimento da Mulher (UNIFEM) em todo o mundo.
No Brasil, atualmente, não existe na Câmara dos Deputados projeto específico referente à igualdade de gêneros, tramitando na Comissão Permanente de Direitos Humanos, os que lá se encontram e tratam de forma incidente do tema são o projeto de lei n.o 5.451 de 2001 tendente a abolir discriminação de ordem sexual – entre outras – no provimento de cargos por seleção; o projeto de lei n.o 1.026 de 1995 que tipifica como crime as condutas discriminatórias – entre elas as de ordem sexual.
No âmbito do Poder Judiciário, a jurisprudência tem reconhecido em algumas hipóteses o direito das mulheres, mas em outras o conservadorismo é saliente; no Supremo Tribunal Federal, está consolidado o entendimento nas duas turmas, que não existe inconstitucionalidade na adoção de critérios diferenciados para homens e mulheres para a promoção de cabos na aeronáutica[8]. No entanto, tal exegese, data vênia a Corte Constitucional entender que não ofende ao princípio da igualdade, tem sido utilizada para permitir a promoção de oficiais do sexo masculino em postos do quadro feminino, sem admitir a possibilidade inversa, sendo que tal distinção é legitimada pela natureza das atribuições de cada um dos quadros de oficiais da corporação (Cf. RE 375896/RJ - Rio de Janeiro, publicado no DJ 17/02/2005, p.46).
Em outro caso, no entanto, o Supremo entendeu que a previsão no edital de concurso para Polícia Federal, da prova de subida em corda, com marca mínima diferente para homens e mulheres (sendo cerca de 1 metro menor para as mulheres), não afronta o princípio da isonomia (art. 7º, XXX, C.F.), uma vez que respeita a desigualdade física entre homens e mulheres, sendo ainda certo que o referido exame de aptidão física foi utilizado, indistintamente, para todos os candidatos (Cf. RE 354148/ DF - Distrito Federal, publicado no DJ 29/09/2004, p. 74).
O Superior Tribunal de Justiça entende que não existe ofensa ao princípio da igualdade a fixação de número de vagas inferior, ou da abertura de concurso público de ingresso nos Corpos de Bombeiros, e Polícia Militar exclusivamente para homem[9].
Em outro acórdão, os Ministros do STJ decidiram que atenta contra princípio da isonomia às distinções das condições de trabalho entre homens e mulheres[10], apesar disso, ainda refletindo certo sexismo, afirmaram que as distinções que se justificam são as decorrentes da natureza. De fato não se pode negar a existência de diferenças biológicas entre homens e mulheres, mas essas diferenças não são suficientes para afirmar a maior ou menor aptidão de homens ou mulheres para determinados tipos de atuação profissional.
Talvez a mais interessante construção jurídica protetiva com relação à mulher, presente no nosso ordenamento, esteja esboçada nos critérios diferenciados de aposentadoria, que considera suas maiores dificuldades de entrada no mercado de trabalho, mas sobretudo sua dupla jornada.
A Presidência da República tem uma Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, responsável por implementar ações de promoção dos direitos das mulheres por meio do Plano Nacional de Política para as Mulheres.
Destaque-se ainda a iniciativa da Articulação das Mulheres do Brasil que redigiram uma Carta Política, no contexto geral das eleições 2006, que faz algumas constatações lastimáveis:
Permanecem, no Brasil, a produção e reprodução da desigualdade, da injustiça social e da pobreza. No mercado de trabalho, a situação das mulheres, em termos substantivos, não foi alterada: o sexismo, o racismo e o trabalho precário persistem, distanciando muitas mulheres de conquistas históricas do conjunto da classe trabalhadora.
A divisão sexual do trabalho e dupla jornada, continuam sendo barreiras à autonomia econômica das mulheres. Persiste a dominação patriarcal, o racismo, a xenofobia, o sexismo, a homofobia, agrava-se a exploração econômica no capitalismo e fortalece-se no mundo a doutrina do livre mercado.
Aprofunda-se a expropriação mercantil do corpo e da sexualidade das mulheres e cresce a banalização da exploração da sexualidade para fins de lucro. Além disto, o não reconhecimento da liberdade e dos direitos sexuais das mulheres é especialmente nefasto para as mulheres negras e lésbicas, sobre as quais pesam, ademais, as discriminações de cunho racista e homofóbico.
A mercantilização nos serviços de saúde, a precariedade do SUS e o conservadorismo moral são bloqueios importantes ao pleno exercício dos direitos reprodutivos para as mulheres, que são desrespeitados tanto quando as mulheres desejam a maternidade; quando decidem interromper a gravidez realizando um aborto ou quando desejam evitar filhos. Faltam métodos contraceptivos e seguem morrendo mulheres por complicações na gestação, no parto e no aborto.
Crescem as investidas dos setores religiosos fundamentalistas na política, ameaçando as liberdades democráticas e o princípio constitucional da laicidade do Estado brasileiro.
Cresce a violência nas relações sociais no campo e nas cidades e contra as mulheres. Criminaliza-se os movimentos sociais e todas/os as/os defensoras/es de direitos.[11]
A Carta finaliza defendendo a igualdade de gêneros, o fim da homofobia, o combate ao racismo e ao machismo sexista predominante na nossa sociedade, bem como a destinação de finanças públicas a serviço da justiça distributiva.
À guisa de conclusão é preciso ressaltar que o objetivo deste tópico não foi inventariar todas as formas de exclusão da mulher no direito, mas de denunciar alguns aspectos perversos dessa dinâmica, que se camufla de várias formas. O direito posto é machista e se ocupa prioritariamente dos problemas dos homens.
2 O NASCIMENTO DOS DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS
Durante este processo de reconhecimento do direito da mulher releva-se a conquista dos direitos sexuais e reprodutivos, como resultado de uma série de fatores a exemplo da intensificação dos processos de urbanização, o desenvolvimento de métodos contraceptivos, o aumento das lutas feministas e a legalização do aborto em alguns países. A possibilidade de controle do próprio corpo representou um avanço significativo de autonomia para a mulher.
De fato, esse alcance só foi possível ante a formulação de vários documentos internacionais que previam direitos ligados às prerrogativas de exercício da reprodução e sexualidade femininas, envolvendo desde o direito à vida e autonomia corporal, até mesmo o direito de livre participação política.
Dentre estes documentos ganham destaque as Conferências Mundiais Sobre a Mulher, a Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (1979), a Convenção Internacional contra a Tortura e outros Tratamentos ou Punições Cruéis, Desumanas ou Degradantes (1984), a Convenção sobre os Direitos da Criança (1989), e, em especial, a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (realizada na cidade do Cairo, Egito, em 1994).
Nota-se por eles que a luta pelos direitos reprodutivos e sexuais sempre esteve ligada no âmbito estatal à questão demográfica, haja vista que a ascensão dos movimentos malthusiano e neomalthusiano impunham a difusão de estudos sobre mecanismos de redução da fertilidade e a imposição deles à mulher, protagonista no processo reprodutivo, sem se preocupar, contudo, com o bem-estar feminino.
Assim, as discussões ganharam espaço nas chamadas conferências internacionais de população, em que as mulheres manifestaram sua capacidade de “decidir se, quando e como querem ter seus filhos”, relacionando esta prerrogativa tanto a sua emancipação política e social quanto ao livre exercício de sua sexualidade, ainda que as ativistas da Europa e América do século XIX e da Ásia, África do Norte e América Latina do século XX, como bem observam Corrêa e Petchesky (1996, p. 152), tenham enfatizado seu aspecto negativo (com o direito de recusar a prática sexual e a gravidez indesejadas). 
Tanto a versão negativa quanto a versão afirmativa das primeiras formulações relativas aos direitos reprodutivos estavam embasadas nos princípios da igualdade, autonomia pessoal integridade corporal. Ambas partiam de uma mesma premissa: para que as mulheres atingissem uma posição igual a dos homens na sociedade, deveriam ser respeitadas como agentes morais ativos, com projetos e objetivos próprios; elas mesmas deveriam determinar os usos – sexuais, reprodutivos ou outros – de seus corpos (e mentes). (CORRËA; PETCKESKY, 1996, p. 152)
 Todavia, o foco dessa discussão foi efetivamente deslocado para a saúde sexual e reprodutiva da mulher, resultando na mudança do paradigma estabelecido, com a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD) do Cairo (1994), que estabeleceu um Plano de Ação com importantes considerações sobre a igualdade de gênero e o planejamento familiar. Além de trazer um conceito aos direitos reprodutivos, abriu espaço para o reconhecimento dos direitos sexuais, que acabaram por não constar expressamente no documento: 
7.2 [...] A saúde reprodutiva implica, por conseguinte, que a pessoa possa ter uma vida sexual segura e satisfatória, tenha a capacidade de reproduzir e a liberdade de decidir sobre quando, e quantas vezes o deve fazer. Implícito nesta última condição está o direito de homens e mulheres de serem informados e de ter acesso a métodos eficientes, seguros, permissíveis e aceitáveis de planejamento familiar de sua escolha, assim como outros métodos, de sua escolha, de controle da fecundidade que não sejam contrários à lei, e o direito de acesso a serviços apropriados de saúde que dêem à mulher condições de passar, com segurança, pela gestação e pelo parto e proporcionem aos casais a melhor chance de ter um filho sadio. [...]
7.3 [...] Esses direitos [reprodutivos] se baseiam no reconhecido direito básico de todo casal e de todo indivíduo de decidir livre e responsavelmente sobre o número, o espaçamento e a oportunidade de seus filhos e de ter a informação e os meios de assim o fazer, e o direito de gozar do mais alto padrão de saúde sexual e de reprodução.[...](ONU, 1994, grifo nosso)
Tais conquistas foram ratificadas na Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial da Mulher (1995) em Pequim, que também ampliou a abrangência de discussões, apontando os direitos sexuais e reprodutivos como “parte inalienável dos direitos humanos universais e indivisíveis”, além de reafirmar a igualdade, equidade e autodeterminação da mulher como princípios basilares. (PIOVESAN; PIROTTA, 2012, p. 335)
É através dessas previsões que se conclui que os direitos sexuais e reprodutivos importam no livre exercício da sexualidade e reprodução, compreendendo inúmeros direitos que servem de garantia a sua consecução, e cuja abrangência está em constante expansão.
São exemplos aqueles listados em uma cartilha educativa confeccionada e distribuída pelo próprio Ministério da Saúde brasileiro, que aponta como direitos correlatos aos direitos reprodutivos:
Direito das pessoas de decidirem, de forma livre e responsável, se querem ou não ter filhos, quantos filhos desejam ter e em que momento de suas vidas.
Direito a informações, meios, métodos e técnicas para ter ou não ter filhos.
Direito de exercer a sexualidade e a reprodução livre de discriminação, imposição e violência. (BRASIL, 2006, p. 04)

Quanto aos direitos sexuais:

Direito de viver e expressar livremente a sexualidade sem violência, discriminações e imposições e com respeito pleno pelo corpo do(a) parceiro(a).
Direito de escolher o(a) parceiro(a) sexual.
Direito de viver plenamente a sexualidade sem medo, vergonha, culpa e falsas crenças.
Direito de viver a sexualidade independentemente de estado civil, idade ou condição física.
Direito de escolher se quer ou não quer ter relação sexual.
Direito de expressar livremente sua orientação sexual: heterossexualidade, homossexualidade, bissexualidade, entre outras.
Direito de ter relação sexual independente da reprodução.
Direito ao sexo seguro para prevenção da gravidez indesejada e de DST/HIV/AIDS.
Direito a serviços de saúde que garantam privacidade, sigilo e atendimento de qualidade e sem discriminação.
Direito à informação e à educação sexual e reprodutiva.(BRASIL, 2006, p. 04)

Nesta perspectiva, os direitos sexuais e reprodutivos importam na afirmação de direitos de primeira dimensão (“escolha de se e como o indivíduo pretende se reproduzir”), determinando uma atuação negativa do Estado, bem assim de direitos sociais, que impõem uma atuação estatal positiva, empreendendo políticas públicas para sua efetivação, como a saúde e educação sexuais e reprodutivas.
Note-se que, apesar de interligados, têm compreensões diferentes, o que foi possível diante dos avanços biotecnológicos que importaram a separação da sexualidade e da reprodução, seja pelo acesso e uso de métodos contraceptivos de qualidade (sexualidade sem reprodução), seja pela reprodução assistida (reprodução sem sexualidade).
Mattar (2008, p. 65-76) ainda aponta uma série de distinções entre tais direitos nas perspectivas histórica, moral (com enfoque na Igreja Católica) e jurídica. Contudo, há que se relevar que essa diferenciação ainda não é visualizada plenamente no ordenamento brasileiro, a exemplo do que constata Barsted (2008, p.247-248), que relata que até a década de 90 quase a totalidade das referências a questões de sexualidade eram feitas em dispositivos relativos à família.
Todavia, ainda que não se possa caracterizá-los de forma totalmente diferenciada no ordenamento brasileiro, conclui-se que, por encontrarem previsão tanto em documentos internacionais quanto na legislação interna, além de se pautarem no valor basilar da dignidade da pessoa humana, postam-se como direitos humanos e fundamentais.

3 NOVOS DESAFIOS À PROTEÇÃO DOS DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS DA MULHER
Apesar do reconhecimento dos direitos sexuais e reprodutivos como direitos humanos e fundamentais, nota-se o surgimento de inúmeros desafios a sua proteção impostos principalmente pela evolução da Bioética e do Biodireito.
Configuram-se, assim, situações de colisão entre eles e outros direitos fundamentais, devendo-se socorrer ao Poder Judiciário ante muitas vezes a inexistência de previsão legal específica que solucione esses conflitos.
Para ilustrá-los foram selecionadas três temáticas atuais de discussão, o aborto, a reprodução artificial post mortem e a maternidade de substituição. Releva-se que o intuito do trabalho não é esgotá-las, mas demonstrar como colocam em xeque alguns valores principiológicos e direitos fundamentais ligados ao exercício da reprodução e sexualidade da mulher, e como estão sendo solucionadas pelo Poder Judiciário brasileiro.
A primeira discussão a ser travada é a do aborto, que envolve questões não somente de ordem jurídica, mas também biológica e ética. Sua compreensão coloca em confronto o direito à vida do feto (daí a se discutir quando realmente começa a vida) e a autonomia corporal e o projeto de vida da gestante, ganhando tratamentos dos mais variados nas legislações de cada país.
No Brasil, diferentemente do que ocorre na Espanha, por exemplo, local em que a legislação sobre o assunto é considerada mais liberal, seu tratamento é moderado, tomando-se o aborto como crime contra a vida de competência do Tribunal do Júri e aceitando sua realização a título de exceção.
Nesse sentido, sua previsão se encontra nos artigos 124 a 128 do Código Penal, que versam sobreo aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento, por terceiro, o aborto necessário (quando em risco a vida da gestante) e o aborto em caso de gravidez resultante de estupro (aborto sentimental).
Contudo, há que se ressaltar que as previsões brasileiras sofrem variações de interpretação para as modalidades aceitas, ora assumindo horizontes mais restritivos, ora mais extensivos, como ocorre nas situações em que a gravidez coloca em risco a saúde da gestante, não propriamente sua saúde física mas também mental, e não levando necessariamente a um risco de morte à mãe, como também à inviabilidade do nascimento com vida.
Este foi o tema de uma recente decisão do Supremo Tribunal Federal na Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n. 54, ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde (CNTS) e que, por versar sobre inúmeros paradigmas éticos e socioculturais, contou com a oitiva de inúmeros representantes da sociedade, líderes religiosos e profissionais da biotecnologia e medicina, para decidir se a interrupção de gravidez de feto com anencefalia encontraria tipificação nos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, do Código Penal.
A anencefalia é uma malformação congênita do feto, resultando na ausência parcial de crânio e de encéfalo pelo defeito no fechamento do tubo neural durante a formação embrionária, razão pela qual não existe expectativa de vida extrauterina; se o feto chegar a alcançar o final da gestação, sobrevive por pouco tempo, sendo considerado praticamente um natimorto cerebral (situação já consignada na Resolução n. 1.752/2004 do Conselho Federal de Medicina). Assim, como a potencialidade de vida é um pressuposto à configuração do aborto, segundo a proponente não se poderia caracterizar tal ilegalidade. Nas palavras do Ministro Marco Aurélio Mello ao redigir seu voto: “anencefalia e vida são termos antitéticos”.
Alegou-se ainda que o ordenamento brasileiro fixa o marco para o fim da vida (que, segundo a Lei n. 9434/97, Lei de Transplante de Órgãos, por interpretação de seu artigo 3º, ocorre com a morte encefálica), mas não para seu começo. Por conseguinte, não havendo vida, tão pouco expectativa dela, não haveria aborto.
Com um julgamento procedente, os Ministros ressaltaram, de maneira geral, a laicidade do Estado, a inviabilidade da vida fetal em caso de anencefalia, devendo-se proteger a liberdade de escolha e, por conseguinte, a saúde física (pelas complicações que envolvem a gestação anencefálica, como a maior incidência de diabetes, hipertensão, parto prematuro, dentre outros) e principalmente mental da gestante (ante a penúria de gestar por 9 meses um filho que sabe que não sobreviverá), possibilitando a realização da interrupção da gravidez sem que se caracterize o aborto.
Levou-se em consideração precedente do Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), proferido em novembro de 2005, em um caso que ficou conhecido como “caso K.L. contra Peru”, em que, não obstante haver a permissão legislativa peruana acerca do aborto terapêutico, o Diretor do Hospital negou-se a realizá-lo, obrigando K.L. a levar a gestação até o fim, situação considerada pelo Comitê como equiparada à tortura.
Cabe ressaltar, assim, mais uma passagem do voto proferido pelo relator Marco Aurélio Mello, em que deixa claro a necessidade de proteção dos direitos sexuais e reprodutivos da mulher ao permitir a interrupção da gestação de feto com anencefalia:
Não se coaduna com o princípio da proporcionalidade proteger apenas um dos seres da relação, privilegiar aquele que, no caso da anencefalia, não tem sequer expectativa de vida extrauterina, aniquilando, em contrapartida, os direitos da mulher, impingindo-lhe sacrifício desarrazoado. A imposição estatal da manutenção de gravidez cujo resultado final será irremediavelmente a morte do feto vai de encontro aos princípios basilares do sistema constitucional, mais precisamente à dignidade da pessoa humana, à liberdade, à autodeterminação, à saúde, ao direito de privacidade, ao reconhecimento pleno dos direitos sexuais e reprodutivos de milhares de mulheres. O ato de obrigar a mulher a manter a gestação, colocando-a em uma espécie de cárcere privado em seu próprio corpo, desprovida do mínimo essencial de autodeterminação e liberdade, assemelha-se à tortura ou a um sacrifício que não pode ser pedido a qualquer pessoa ou dela exigido.
Trata-se, portanto, de uma faculdade a ser conferida à gestante nessa situação, que poderá optar pela interrupção da gestação segundo suas convicções, e se servirá de política pública de saúde adequada para a realização de sua vontade (com apoio obstétrico e psicológico).
Dessa forma, o Supremo Tribunal Federal atuou como legislador positivo, haja vista que esta forma de “aborto legalizado” não encontra previsão no Código Penal e o órgão responsável para deliberar sobre o caso, qual seja, o Congresso Nacional, não o fez, permitindo a intervenção judicial.
Já o aborto sentimental, por sua vez, tem como objeto a proteção da saúde psicológica da mulher e sua liberdade reprodutiva, evitando que seja obrigada a sofrer para sempre os efeitos do crime de que foi vítima.
Deve-se levar em análise, por fim, que qualquer modalidade de aborto permitido exige do Estado uma atuação efetiva para que as mulheres que não possuam condições financeiras suficientes para realizá-lo em clínicas particulares possam fazê-lo na rede pública com plenas condições de higiene e segurança, evitando a morte materna.
O segundo tópico selecionado considerado como gerador de amplos debates pela Bioética e Biodireito é a inseminação artificialpost mortem, ou seja, o método de reprodução assistida realizado após a morte do genitor, o que só se fez possível diante das novas técnicas de criopreservação do material genético do pai.
A possibilidade de preservação de material genético significou um procedimento importante ao exercício do direito de planejamento familiar e projeto de vida, vez que pode ser utilizado por homens em situação de risco de esterilização, como no caso de tratamento de câncer nos testículos. Contudo, gerou inúmeras discussões, como demonstra Eduardo Leite (2012, p. 190):

[...] Assim, a título de exemplo, questionou-se: [...] Seria válida a vontade manifestada pelo marido antes de morrer, a respeito do material congelado para inseminar sua mulher? Em assim sendo, a viúva poderia dispor do esperma congelado após a morte do marido? Qual a validade da manifestação escrita em face da ausência de previsão legal? Em caso de inseminação pela esposa, que tipo de filiação usufruiria este filho? Quais seriam seus direitos em face da pessoa e do patrimônio do pai?
O cerne das questões gira em torno da oposição entre o princípio do melhor interesse da criança (que nasceria e cresceria sem a convivência paterna) e os interesses da viúva (em realizar seu projeto parental), como, segundo narrado por Eduardo Leite, restou demonstrado no paradigmático “Caso Parpelaix”, ocorrido na França em 1984.
Em breves linhas, o caso diz respeito a um casal francês que vivia em união estável e, em decorrência de um câncer de testículo que acometeu o homem, criando risco de esterilidade, teve que depositar seu esperma em um banco genético. Contudo, o marido veio a falecer e o banco negou-se a devolver o material coletado, levando-se o caso ao Tribunal de Créteil, que decidiu pela restituição à esposa, a qual, por sua vez, empreendeu uma tentativa fracassada de inseminação artificial.
Segundo o autor (2012, p. 192-193), ficou claro até mesmo pelos depoimentos dados pela esposa na época que ela não queria um filho, mas resgatar a imagem do marido morto gerando um “filho ‘ coisificado’ como meio e não como fim”. De fato, essa constatação ilustra a contradição dos interesses existentes.
No Brasil, o primeiro documento a versar especificamente sobre o assunto foi a Resolução n. 1957 do Conselho Federal de Medicina, editada somente em2010, determinando em seu tópico VIII que “Não constitui ilícito ético a reprodução assistida post mortem desde que haja autorização prévia específica do(a) falecido(a) para o uso do material biológicocriopreservado, de acordo com a legislação vigente”.
Contudo, não há na legislação brasileira previsão específica à situação apresentada, versando até mesmo sobre o gênero inseminação artificial de maneira rasa, levando os julgadores a se socorrerem de normas deontológicas como aquelas confeccionadas pelo Conselho Federal de Medicina. Assim, estabeleceu-se como critério à realização da inseminação artificial póstuma a apresentação de consentimento escrito do marido.
Contudo, há casos em que tais requisitos estão sendo vistos de maneira flexível, como ocorreu em uma decisão proferida em 2010, em que o juiz Alexandre Gomes Gonçalves, da 13ª Vara Cível de Curitiba, concedeu liminar para que a professora Kátia Lenerneier pudesse usar o sêmen congelado do marido para fazer uma inseminação artificial, ainda que não houvesse consentimento escrito, vez que a requerente comprovara por meio de outras provas a intenção do de cujus em ter um filho do casal.[12]
Soma-se às discussões a dificuldade em se determinar a situação patrimonial do filho havido após a morte do pai frente a inexistência de previsão específica no ordenamento brasileiro e a possibilidade de diversas construções jurídicas com base nos subsídios legislativos existentes, de maneira que vários posicionamentos se estruturaram: aqueles que negam a sucessão e aquelas que a afirmam, dividindo-se por sua vez na defesa de uma sucessão legítima ou na defesa de uma sucessão testamentária.
Deste modo, resta evidente a criação de um dilema à efetivação dos direitos reprodutivos da mulher semelhante ao desafio imposto no caso do aborto: interesses da mulher em colocar em prática seu projeto de vida em contraposição aos interesses do filho a ser gerado, que não gozará da convivência paterna e enfrentará a omissão legislativa e a divergência doutrinária e jurisprudencial quanto aos seus direitos patrimoniais.
Por fim, a maternidade de substituição, também conhecida como “barriga de aluguel”, pode ser entendida como o acordo pelo qual uma mulher se compromete a gerar e dar à luz a um filho, entregando-o a outra e, com isso, renunciando a todos os direitos sobre a criança, inclusive a classificação jurídica de “mãe”. (RAPOSO, 2005, p. 13)
Tal prática se rege no Brasil pela Resolução n. 1358 do Conselho Federal de Medicina brasileiro, listando como requisitos a sua realização o impedimento da doadora genética de gestar ou sua contraindicação por problemas médicos, bem assim a finalidade altruística da hospedeira e seu parentesco com a doadora genética em até o segundo grau (salvo nos casos de autorização do próprio Conselho).
A exemplo do que fora relevado anteriormente, tal resolução não possui caráter vinculativo, mas vem sendo utilizada como subsídio à decisão pelos magistrados por força de inexistência de previsão legal específica, apesar de existirem projetos de lei em tramitação.
Nessa situação a discussão permeia a titularidade dos direitos reprodutivos e, por conseguinte, o aferimento da maternidade entre a geniatrix (aquela que fornece seu material genético) e a gestatrix (que leva a gestação a termo).
Em termos práticos, como a maternidade seria atribuída a princípio àquela que deu à luz por força dos procedimentos legais existentes, tal qual o artigo 10, inciso II do Estatuto da Criança e do Adolescente, o processo de reconhecimento à mãe genética importaria em um requerimento de retificação do registro do recém-nascido com a realização de exame de DNA.
O problema (principalmente de cunho ético) surge em face da negativa da gestora na entrega do bebê (uma requisição dupla da maternidade) ou na negativa dos pais biológicos em recebê-lo, pelo acometimento de uma deficiência, por exemplo (conflito negativo de maternidade). Passa-se então a uma mudança de valores: enquanto antigamente se tinha a possibilidade de incerteza somente quanto ao pai, hoje essas possibilidades biotecnológicas estendem a incerteza à maternidade; o princípio “matersemper certa est” (a mãe é sempre certa) já não tem mais validade absoluta.
Mais uma vez cabe ao juiz decidir esse conflito sopesando o melhor interesse da criança e outros princípios como o da afetividade na filiação (que fundamenta a intenção da maternidade) e, em última análise, o próprio direito ao conhecimento da origem genética, assunto que vem ganhando espaço nas discussões jurídicas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
De fato, as discussões acerca da afirmação dos direitos da mulher ainda ganham espaço diante dos novos desafios que surgem, importando ora o reconhecimento das diferenças – discriminação positiva e lícita -, ora a promoção da igualdade, para que se possa, enfim, construir uma sociedade, cultural, social e juridicamente menos sexista e excludente.
Quando se tem em pauta os direitos sexuais e reprodutivos de titularidade feminina a dificuldade de afirmação mostra-se ainda mais latente, porquanto historicamente condicionados a interesses político-econômicos através da promoção do controle natalista.
Contudo, com a mudança na conjuntura advinda de avanços teóricos calcados essencialmente na promoção dessa igualdade material dos gêneros, a década de 90 tornou-se um marco ao efetivo reconhecimento dos direitos reprodutivos e sexuais, passando a ser reconhecidos como humanos e fundamentais.
Ainda que em muito se critique a ineficiência da previsão na legislação brasileira para a proteção desses direitos, um maior estímulo ao empreendedorismo, à “quebra de tabus”, à criação doutrinária e à comoção social, a cobrança dos representantes para uma atuação garantista e a participação, através do “empoderamento”, poderiam significar a real assunção da mulher à posição de titular de direitos sexuais e reprodutivos, no pleno exercício da cidadania e da democracia.
A Bioética e o Biodireito só vêm ratificar o surgimento de novos horizontes à compreensão desses direitos. O aborto, a reprodução artificial póstuma e a maternidade de substituição são somente alguns exemplos desses desafios éticos e jurídicos que despontam, preconizando a necessidade de uma maior atenção aos anseios sociais e de uma efetiva produção legislativa.

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[1] Houve quem durante ao iluminismo defendesse o feminismo. Montesquieu em seu romance filosófico intitulado Cartas Persas faz referência ao filósofo Poullain de la Barre, seu contemporâneo, na Carta de n.o 38: “[...] Não – dizia-me outro dia um filósofo galantíssimo com as mulheres –, a natureza jamais ditou uma lei nesses termos. O império que detemos sobre elas é uma autêntica tirania; elas só nos deixaram adquiri-lo porque são mais doces do que nós, e portanto também mais humanas e racionais. Se fôssemos razoáveis, essas vantagens certamente lhe valeriam ser consideradas superiores a nós, mas como não o somos, fizeram que sejam tidas por nossas inferiores. Ora, se é certo que sobre as mulheres só detemos um poder tirânico, não é menos certo que elas exercem sobre nós um império natural – o da beleza, ao qual nada resiste. O domínio masculino não existe em todos os países, mas o da beleza é universal. Porque, então, teríamos algum privilégio? Seria por sermos mais fortes? Mas trata-se de uma verdadeira injustiça. Utilizamos todos os meios para abater-lhes a coragem; se recebessem a mesma educação suas forças se igualariam às nossas. Bastará exercitá-las nos talentos que sua educação não tenha debilitado, e veremos se somos tão fortes assim”(MONTESQUIEU, 2005, p. 60)
[2] Os que atacavam as feministas socialistas com fundamento na suposta promiscuidade aventada pelo comunismo, justificavam sua argumentação na seguinte passagem do Manifesto: “Abolição da Família! Até os mais radicais ficam indignados diante desse desígnio infame dos comunistas. Sobre que fundamento repousa a família atual, a família burguesa? No capital, ganho individual. A família na sua plenitude, só existe para a burguesia, mas encontra seu complemento na supressa forçada da família para o proletário e na prostituição pública. A família burguesa desvanece-se naturalmente com o desvanecer de seu complemento e uma e outra desaparecerão com o desaparecimento do capital. Acusai-nos de querer abolir a exploração das crianças por seus próprios pais? Confessamos este crime. Dizeis também que destruímos os vínculos mais íntimos substituindo a educação doméstica, pela educação social.” (MARX, K., ENGELS, F. 2000, p. 35)
[3] “É o caso do movimento feminista de "segunda onda", nos termos do autor, cuja ênfase na não adequação dos "direitos humanos" à condição da mulher resulta por exigir o "direito à diferença". Afirmando que os sujeitos são sexualmente engendrados, essa vertente do movimento feminista aponta a inexistência do sujeito abstrato dos direitos humanos e a necessidade de se incluir a "diferença" das mulheres nesse contexto. É nesse ponto que se produz a grande "cilada da diferença" proposta por Pierucci, instalando-se um dilema entre abstrato/universal e concreto/particular. Esse discurso, ao se desvincular do compromisso com a abstração das particularidades, assume a demanda pelo reconhecimento e pela valorização de novas diferenças que atravessam seu caminho. No exemplo de Pierucci, tão logo se observou a diferença das mulheres, emergiram as "diferenças de dentro": as mulheres não-brancas passaram exigir que se contemplasse sua diferença, não mais de gênero, mas de etnia. O argumento permanece o mesmo: a noção de "mulher universal" é criticada como mera abstração, válida apenas para as mulheres brancas. É próprio da diferença, portanto, abrir demandas pelo aparecimento de outras diferenças, sempre pautadas no que é no fundo um dado natural e visível. O aspecto irônico de todo esse processo, para o autor, traduz-se no fato de que são esses mesmos discursos os primeiros a se contraporem a todo tipo de essencialismo” NUERNBERG, 2001, p.299-300.
[4] RIBEIRO, Antonio Sérgio. A mulher e o voto. Artigo Disponível no site da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo. http://www.al.sp.gov.br/web/eleicao/mulher_voto.htm Acesso em 12 de setembro de 2006
[5]Dados da ONG da Igreja Católica alemã Misereor, disponíveis no site http://www.misereor.org/index.php?id=8099&L=3 , acesso em 14 de setembro de 2006.
[6] O fato de o Amapá ter figurado com o Estado que tem os menores índices de desigualdade não significa que lá existe promoção da igualdade efetiva. Acontece que as variáveis utilizadas são a população de 10 anos e mais de idade, economicamente ativa (PEA) na semana de referência, discriminada por sexo e o respectivo rendimento médio mensal.  A fonte das variáveis é o IBGE, através da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD).  O IBGE considera apenas os rendimentos de emprego formal na elaboração da pesquisa.
[7] Relatório disponível em francês no site http://europa.eu/scadplus/leg/fr/cha/c10153.htm “De nouvellesavancéesontétéréaliséesen 2005 enmatière d'égalité entre hommesetfemmes : l'annonce par laCommission d'une communication " feuille de routepourl'égalité entre lesfemmes et leshommes" en 2006 quidéfiniralesproblèmes à résoudre et lesactions à menerjusqu'en 2010;  l'adoption d'une propositionmodifiée de directivevisant à lasimplification et lamodernisation de lalégislationcommunautaireexistantesurl'égalité de traitement entre hommes et femmesenmatière d'emploi ;  lacréation d'organismes de promotion de l'égalité ;  laproposition de création d'unInstituteuropéenpourl'égalité entre leshommes et lesfemmes ;  l'adoption par lespartenairessociaux, danslecontextedu dialogue social européen, d'uncadre d'actionspourl'égalitédessexes (quatrepriorités : se penchersurlesrôlesmasculins et féminins, promouvoirl'accessiondesfemmesaux postes de décision, favoriserl'équilibre entre vieprofessionnelle et vieprivée, réduirel'écart de rémunération entre lessexes);  l'adoption d'unprogrammecommunpourl'intégrationdesressortissants de paystiers (égalitédessexesdansl'immigration, traitedesêtreshumains, exploitationsexuelle, exploitationliéeautravail domestique) ;  l'adoption par laCommission, leConseil et leParlementeuropéen d'une déclarationconjointeintitulée « Le consensus européenenmatière de politique de développement » danslaquellel'égalitédessexes est définiecommeétantl'undescinqgrandsprincipes de la politique de développement ;  l'intégration de l'égalitédessexescommepriorité de la nouvelle stratégie de l'UEpourl'Afrique.”  (acesso em 14 de setembro de 2006)
[8] EMENTA do RE-AgR 406166 / BA - BAHIA: “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PROMOÇÃO DOS CABOS INTEGRANTES DO CORPO FEMININO E DO CORPO MASCULINO DA AERONÁUTICA. CRITÉRIOS DISTINTOS. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. NÃO-VIOLAÇÃO. Ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal já afirmaram que a adoção de critérios distintos para a promoção dos cabos integrantes do corpo feminino da Aeronáutica, na forma da Portaria ministerial nº 120/GM3/84, não ofende o princípio da isonomia entre homens e mulheres. Precedentes: AI 511.131-AgR, Relator Ministro Sepúlveda Pertence; AI 439.414-AgR, Relator Ministro Marco Aurélio; RE 316.882-AgR, Relator Ministro Carlos Velloso; RE 380.200-AgR, Relator Ministro Gilmar Mendes; e RE 336.866-AgR, Relatora a Ministra Ellen Gracie. Agravo regimental desprovido.” Publicação:  DJ 23-06-2006 pp-48 Ementa Vol-02238-03 pp-525.
[9]Confira os RMS 19464/SC, DJ 06.03.2006 p. 417; RMS 10182/RN, DJ 05.03.2001 p. 184; REsp 173312/MS, DJ 22.03.1999 p. 262.
[10] “MANDADO DE SEGURANÇA - TRABALHO DA MULHER. O PRINCIPIO DA IGUALDADE VEDA DISTINÇÃO ENTRE HOMEM E MULHER.SO SE JUSTIFICAM AS DIFERENÇAS RESULTANTES DA NATUREZA. NÃO E O CASO DE CONDIÇÕES DO TRABALHO. DISTINGUIR A ESSE FUNDAMENTO RESULTA PREJUIZO NA DISPUTA DO MERCADO DE TRABALHO, O QUE AFETA A ISONOMIA.” DJ 25.09.1989 p. 14951 RSTJ vol. 7 p. 260.
[11] Disponível no site  http://www.articulacaodemulheres.org.br. Acesso em: 16 de setembro de 2006
[12] Matéria veiculada pela Rede Globo em seu portal eletrônico. Disponível em: <http://g1.globo.com/brasil/noticia/2010/05/justica-autoriza-professora-usar-semen-de-marido-morto-no-parana.html>. Acesso em: 01 out. 2012.